Após mais uma dezena de telefonemas feitos para a central de táxis, dei por mim a imaginar o tipo de formação que as telefonistas devem receber a início. É que não é fácil uma pessoa demonstrar de forma tão elucidativa o quanto a aborrece falar com outra. Aqueles suspiros tão prolongados que estou sempre à espera de as ouvir cair para o lado, roxas, com falta de ar. Aqueles "hum hum" pronunciados pelo nariz (e imagino-os sempre a escapar das narinas com o fumo cinzento de um cigarro comprido e fininho) que nos dizem "não te estou a ouviiiir". Quantas horas de treino implicará toda esta aparelhagem de que é dotada cada telefonista? Quantos dias serão precisos até serem capazes de fazer com que nos sintamos a pessoa mais irritante à face da terra? Às vezes, quase que nos temos de desculpar por ligar.
- Mas isso é ao pé "daonde"?
- Olhe, eu não sei, só tenho a morada
PFFFF (mistura de suspiro com baforada de touro enraivecido)
Felizmente, as centrais de táxi ainda não implementaram as videochamadas, porque aí, meus amigos, tudo será muito pior. Desde olhares desdenhosos a abanares de cabeça milimetricamente estudados para nos fazerem sentir mais do que envergonhados por não sabermos de cor e salteado onde fica a Rua Nossa Senhora das Cabaças e ainda ousarmos (ousarmos!) pedir um táxi para nos levar lá.
E, quando alguma é simpática, aposto que deve ser imediatamente espancada, mal desliga o telefone! Afinal, há limites para tudo!
Wednesday, October 29, 2008
Wednesday, October 01, 2008
O hippie que gostava de lucky strikes...
“É strike. Como o Lucky Strike mas sem o Lucky: é assim que se diz greve em inglês.”
Desligou o telefone. A frase fez-me olhar outra vez para ele: de cabelo comprido, barba, bigode, óculos de sol à John Lennon. Um hippie com os seus cinquenta anos que ensinava greves em inglês pelo telefone, auxiliando-se de uma marca de tabaco, enquanto conduzia o táxi pela A5. No rádio tocava música clássica: ele ia tamborilando os dedos sobre o volante, num teclado invisível.
Pensei como seria há trinta anos. E como o seu passado se parecia reflectir no seu presente. Quase todos os hippies ficaram nas fotografias. Enterrados em baús de calças à boca de sino e camisas coloridas. Um bilhete de um concerto, alguns discos, pedaços de poemas escritos em pacotes de açúcar.
Queria perguntar-lhe como era o mundo quando ele tinha 23 anos, como eu. Que mais palavras se faziam a partir dos maços de tabaco: King’s, Double Happiness, Silk Cut... E desejar-lhe que a sua strike também fosse cheia de sorte, como a do maço de tabaco.
Mas limitei-me ao bom dia, depois de pagar.
Desligou o telefone. A frase fez-me olhar outra vez para ele: de cabelo comprido, barba, bigode, óculos de sol à John Lennon. Um hippie com os seus cinquenta anos que ensinava greves em inglês pelo telefone, auxiliando-se de uma marca de tabaco, enquanto conduzia o táxi pela A5. No rádio tocava música clássica: ele ia tamborilando os dedos sobre o volante, num teclado invisível.
Pensei como seria há trinta anos. E como o seu passado se parecia reflectir no seu presente. Quase todos os hippies ficaram nas fotografias. Enterrados em baús de calças à boca de sino e camisas coloridas. Um bilhete de um concerto, alguns discos, pedaços de poemas escritos em pacotes de açúcar.
Queria perguntar-lhe como era o mundo quando ele tinha 23 anos, como eu. Que mais palavras se faziam a partir dos maços de tabaco: King’s, Double Happiness, Silk Cut... E desejar-lhe que a sua strike também fosse cheia de sorte, como a do maço de tabaco.
Mas limitei-me ao bom dia, depois de pagar.
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