Responsabilidade.
Só a palavra arrepia-me. É uma palavra feia, a língua bate na parte de trás dos dentes e depois estica-se cá para fora, toda enrolada "RES-PON-SA-BI-LI-DA-DE".
Gostava de encontrar os senhores inventores da língua portuguesa e dar-lhes dois calduços para ver se se deixavam de ideias destas.
"Procura-se pessoa RESPONSÁVEL", dizem todos os anúncios de emprego. Se eu fosse honesta, ficava desempregada para o resto da vida e sobrevivia como assaltante de bancos. Mas é preciso ganhar a vida, e, envergonhando-me da minha desonestidade, lá vou fazendo um esforcinho no sentido de me tornar uma adulta responsável, consciente das suas obrigações, plena de sentido de dever.
Tenho amigos responsáveis que entraram no responsável mundo do trabalho fazendo estágios responsáveis. Eu fiquei na faculdade. Mais umas especializações, que é para ver se me valorizo enquanto profissional. Ou, por outras palavras, POR FAVOR NÃO ME PONHAM JÁ NUM LUGAR RESPONSÁVEL!
Um dia, quando for velhinha, vou ser responsável. Vou tomar sempre os comprimidos a horas, e lembrar-me do sítio onde moro. Vou usar xailes no inverno para não me constipar e vou ter atenção para não dar detergente da roupa aos passarinhos.
Mas por agora, enquanto o mundo é tão grande e eu ainda sou pequena, enquanto as pernas têm formigueiro e me querem levar a todo o lado, deixem-me ser assim, plena de rebeldia e com os olhos abertos e espantados para o mundo, com a cabeça nas nuvens e os pés em algum lado que não vejo. Deixem-me beber a água da chuva e chapinhar os vossos sapatos profissionais com as minhas galochas amarelas.
Sim, em breve tem de ser. Em breve vou ter de deixar a menina e abraçar a senhora. Vou ter de sorrir sem mostrar muito os dentes que fica mal, e usar tons pastéis que são delicados.
Mas prometo a mim mesma que até lá vou fazer tremer o mundo debaixo dos meus pés!!
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