Hoje mudo. Olho ao espelho, digo a palavra em voz alta, fixo os lábios que a soletram, devagar: de-si-lu-são. Não me assustas. Não me encolho, não me escondo. Não procuro o interruptor para a encobrir com a escuridão.
A desilusão, essa palavra feia de negação, há-de estar sempre presente na minha vida. Os lençóis serão roídos por traças muito antes que ela desapareça. O segredo não está na não ilusão, não para mim, mas na aceitação: ao longo da vida, a desilusão há-de bater a esta porta muitas vezes, e eu escutarei a sua mão mirrada na maçaneta, forçando a entrada no meu mundo perfeito.
Recusar a ilusão não será um risco bem maior do que o de nos virmos a desiludir? Que ser, tão forte, tão não humano, se poderá recusar a iludir-se durante toda uma vida? E quantos momentos serão perdido em nome dessa segurança idílica? Como num salto de pára-quedas, confio, salto: por momentos, o céu e só ele sob mim, sob a minha barriga, o sorriso deformado pela força do ar que me empurra os músculos para cima. Confio, porque viver sem confiar em ninguém é viver eternamente sozinho. Salto, porque viver eternamente com os pés na terra é renegar o sonho mais antigo do homem. Confiar, é ganhar asas de papel e cruzar os dedos no momento do vôo, pedir que não se desfaçam em pedaços quando estiver mais alta.
Não podemos confiar sempre e em toda a gente, mas, de vez em quando, é bom confiar. É bom dizer a nós mesmos, no mais profundo dos silêncios que é o pensamento, "confio em ti" e fechar os olhos quando nos dizem: vá, tenho uma surpresa, fecha os olhos e abre a mão.
A vida é demasiado curta para fugir da ilusão. Imagino que isso consuma mais energia e esforço do que recuperar da eventual desilusão. Porque, mais cedo ou mais tarde, ela há-de chegar, e, por mais que tentemos, nunca seremos capazes de a evitar sempre..
Salta.
Confia.
Fecha os olhos.
Vale a pena.
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