Não necessariamente por esta ordem de ideias. Mas a vida é
bastante caótica por aqui. As nossas manhãs parecem saídas do Apocalypse Now,
com pijamas atirados para o sofá, torradas que voam em direção à mesa, segundos
cronometrados para fazer face ao relógio e momentos de puro desespero. Ser mãe
– digo-o com toda a honestidade – é mesmo, provavelmente, a mais difícil
profissão do mundo. Primeiro porque, quando o nosso “funcionário” não cumpre
com os seus deveres, não podemos simplesmente despedi-lo. Se, todas as manhãs,
o nosso funcionário insiste em agarrar-se aos lençóis e não sair da cama, ou se
fica basicamente paralisado a olhar para o pequeno-almoço, não podemos
dizer-lhe: “Olhe lá, isto assim não está a funcionar. Lamento muito. Tem até ao
final do mês”. É complicado.
A mãe é uma espécie de super-heroína*. Verdade verdadinha. A
minha, sobretudo, que parecia arranjar sempre tempo para brincar connosco,
fazer jantares, limpar a casa, atender pacientes e ainda deixar uma mão vazia
para o que desse e viesse. Não sei como – provavelmente, nunca vou saber.
Cada mãe tem os seus truques, um arsenal de armas secretas
aperfeiçoadas ao longo dos anos para conseguir lidar com a loucura que é criar
uma criança. Alguns passam de geração para geração – de repente, damos por nós
a fazer o que as nossas mães faziam, a dizer o que as nossas mães diziam, e
adivinhamos as nossas avós a fazerem o mesmo. Outros, criamo-los nós.
Quando se vive sozinha com uma criança, como eu, a arte de
educar requer armas especialmente eficazes. Há contratos devidamente assinados
entre ambas as partes onde nos comprometemos a “não gritar”, “ser sempre
amigas”, “dar um abracinho apertado e dois beijinhos ao acordar e ao deitar” e
“não chegar atrasadas à escola/trabalho” entre outras cláusulas. Há o quadro de
multas que estipula que por cada minuto extra no banho, após os 15 permitidos,
se devem pagar 5 cêntimos e que cada dia em que nos atrasamos a sair de casa
significa uma multa de 10 cêntimos que deve ser paga pela responsável. Há as
viagens de carro entre casa e a escola que ora são viagens de avião em que os
passageiros podem escolher uma data de sandes e bebidas imaginárias, oferecidas
pelo comandante, ora são fugas a catástrofes naturais como terramotos e
tsunamis terríveis, ora são corridas de táxi guiadas por personagens sempre
diferentes e com sotaques geralmente quase incompreensíveis. Há saltos altos, escada acima escada abaixo - e o que parecia uma excelente forma de fazer exercício torna-se uma espécie de travessia de campo minado - com duas mãos e meia carregadas com mochilas, malas do ballet, lancheiras, saco do ginásio, sacos do lixo, do papel, do plástico, dos vidros, sacos de roupa suja e sacos de roupa limpa, tudo a roçar de forma ameaçadora contra as paredes, organizadas como se se tratassem de incursões militares: AGORA! VAMOS, VAMOS, VAMOS!
E à noite, quando o silêncio relativo de quem mora entre paredes de papel se instala, e finalmente me afundo no sofá (cerca de 5 minutos antes de entrar em coma) há desenhos espalhados de meninas de mãos dadas a sorrir, com balões, arco-íris, cachorrinhos sem qualquer noção de perspectiva e com as quatro patas todas viradas para o mesmo lado, estrelas e confetis. E percebo que no meio do caos também nascem flores.
*o corre(c)tor automático do word não reconhece o termo super-heroína, apenas super-herói. Shame on you, Microsoft, shame on you...
*o corre(c)tor automático do word não reconhece o termo super-heroína, apenas super-herói. Shame on you, Microsoft, shame on you...
2 comments:
Tao linda!
p.s - pergunto-me quem pagará mais "multas"...
lol é a piquena, claro. Mas a mãe, de vez em quando - muuuuito raramente - também comete as suas falhas :P
Saudades tuas le da tua la ;)****
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