Tuesday, November 27, 2007

O dia das boas acções

Ontem foi o meu dia das boas acções. O dia em que acordei decidida a espalhar o bem pelo mundo como se fossem confetis coloridos.

Tudo começou com a resolução de cortar um bocado de cabelo que me incomodava. Isso mesmo, um pedaço de cabelo que me atormentava as manhãs, sempre espetado para os lados, com que fazia malabarismos com ganchos, fitas e elásticos. "Mas onde está a boa acção?", perguntam vocês. É que, para poupar dinheirinho aos pais, decidi cortar... em casa. Chamei então a irmã mais nova, que por acaso é a única que tenho, e pedi-lhe que me cortasse a franja com a tesoura da cozinha. A irmã mais nova é também, curiosamente, a mais sensata, e não estava muito disposta a arriscar cortar-me o cabelo para eu depois ter um ataque de pânico por não gostar. Tive então de recorrer ao seu ponto fraco: a poupança. É que a irmã mais nova e mais sensata é também a mais poupada, e com o argumento de poupar dinheiro cortou-me logo a franja de uma tesourada apenas. ZÁS! Nem tive tempo de repensar a minha decisão.

OH NÃO! O QUE É QUE EU FUI FAZER?! foi a primeira coisa que me saiu da boca. Quem me conhece sabe que eu sou uma activista pelo movimento NÃO À FRANJA, que agora está na moda e portanto toda a gente usa. E ali estava, na mão da minha irmã, o meu grito de guerra, o meu estandarte caído no campo de batalha, todos os meus argumentos para não ter franja... E assim se acabou o movimento que afinal era só constituído por mim mesma...
Depois desta boa acção que beneficiou não só os pais, como o meu cabelo, as meninas da franja que lá venceram o combate e ainda a minha irmã que teve oportunidade de treinar os seus dotes de "chef de cuidados capilares", eu ainda não estava satisfeita.

Sim, tinha feito algo pelo mundo, mas não me bastava. Uma franja assimétrica caseira não era suficiente para mudar o meu dia.

Foi então que, ao chegar a casa, fui visitada por uma amiga asiática (ela não é bem asiática, é especial, digamos...) que tinha encontrado as chaves da minha vizinha penduradas na fechadura da porta da rua. Tomada de todo o meu espírito de bondade, lá me dirigi, depois de 40 minutos de conversa com a minha amiga, ao apartamento da vizinha de idade avançada. E porque é que eu refiro a idade da senhora? Já vão perceber. Toquei à campainha duas vezes, e conseguia ouvir a novela do lado de dentro, aos altos berros... Finalmente a senhora lá se apercebeu que estava alguém à porta.

"Quem é?"

"É a vizinha de cima.."

"Quem éééé?"

"É a vizinha de cima..."

"Quem éééé?"

"É A VIZINHA DE CIMAAAA!"

e ficámos nisto durante alguns 5 minutos até que a senhora lá conseguiu ouvir que era a VIZINHA DE CIMA. Só que havia outro problema: como comprovar que era mesmo a VIZINHA DE CIMA?

"Aiii a luz do patamar não funciona... Não a vejo.."

"A senhora perdeu umas chaves?"

"A luz do patamar não funciona... Não a vejo!"

"A SENHORA PERDEU UMAS CHAVES?"

"Olha, não sei quem é... a luz não funciona..." (isto dizia ela para ela mesma, em voz alta, depois de já termos chegado à conclusão que era a VIZINHA DE CIMA)

Convém dizer que todas as casas têm uma lâmpada do lado de fora que ela podia acender, mas só passada meia hora é que a senhora se lembrou disso.

Finalmente, lá abriu a porta a medo, não fosse eu um ladrão mascarado de VIZINHA DE CIMA. Fiquei a saber que durante esses 40 minutos a senhora fez uma jornada a pé até casa de uma amiga para ir buscar as chaves suplentes (ups! claro que não mencionei o facto de ter as chaves há 40 minutos mas ter estado ocupada com a minha amiga). Descobri que ela e a vizinha da frente vão alternando na mudança das lâmpadas do patamar mas que agora está atarrachada com muita força e portanto não conseguem, que a vizinha do rés-do-chão deixa a porta da rua aberta para o cão ir passear sozinho, possibilitando, assim, a entrada de ladrões, que uma antiga vizinha da senhora foi assaltada por uma brasileira quando ela ainda vivia "lá em cima" (seja lá isso onde for), e, claro, que a minha vizinha é ligeiramente surda...

De regresso a casa, passada meia hora, estava cansada, mas cheia daquele espírito das boas acções. Mas não, não era suficiente.

Cozinhei simples postas de pescada de uma maneira nova e original para os meus pais que não sei se gostaram ou não mas fizeram "nhami nhami". E depois de adormecer a minha filha e ser tempo de partir para o café onde as minhas amiguinhas me aguardavam, pensei: e que tal uma última boa acção? Assim, fiz um balde de pipoquinhas salgadas, a garrafa de água de litro e meio, e o trivial no carro e passámos uma daquelas nossas noites simples mas sempre especiais em que o Joaquín Cortez é o homem da noite (quando não sabemos mesmo a resposta arriscamos o Joaquin Cortez.. ideias daquela minha amiga "especial" a quem a gente diz que é chinesinha, não é mais nada...).

Na hora de adormecer, embalada pelo "Il mio viaggio in Italia" do Scorsese, senti uma luzinha especial a pairar por cima da minha cabeça. Até podia ser o candeeiro da mesinha de cabeceira, diriam os mais cépticos, mas eu senti que era uma pequenina auréola que, por momentos, estava a pairar sobre mim.

1 comment:

Guizita said...

lollllllllllllllllllll!matas.me tu! A AMIGA CHINESINHA PORTANTO SOU EU...QUE BONITO!:p BAH@ beijo