Quando fiz os meus 17 anos e meio (e há quanto tempo foi isso?!), pedi ao meu pai a carta de condução. Era fundamental, essencial, indispensável para a minha vida! Era o meu bilhete para o comboio da independência, para o mundo das meninas crescidas que pintam os lábios paradas no trânsito (apesar de nem sequer usar batôn), para os pés descalços fora do vidro (impossível quando se vai a conduzir), para a música aos berros e cantorias assustadoras ao volante (revelou-se, de facto, a essência da condução).
Tirei a carta, com a garantia de que o pai não me ofereceria o carro. Um dia, teria um carro. Um dia, tal como ele, acabaria a minha licenciatura e compraria o meu calhambeque (bip bip, quero buzinar meu calhambeque!). "Tudo bem, para que é que eu quero um carro?", dizia eu, imaginando-me por aí, no carro do papá, cheio de amigas em pleno estado de êxtase, atravessando as estradas de alcatrão fumegante de todo o país (filmes americanos a mais... eu sei!).
Acabei a carta em Abril. Em Junho tinha um carro na garagem. Ele não era novo, não era brilhante nem tinha o cheiro a pele que sai dos bancos quando nos sentamos num carro pela primeira vez. Mas era meu, só meu, e de mais ninguém. Estado de graça que durou até a minha irmã, um ano depois, tirar a sua carta de condução de veículos ligeiros e passar a dizer que era "nosso". Sacrifícios que se fazem, pelo menos tinha meio carro que era melhor que um banco inteiro no autocarro!
Eu e o meu (meio) Polo! O meu (meio) Polo e eu! Tem cicatrizes de guerra, mas não as temos todos? O volante está gasto, o tablier meio rachado, o porta-bagagens cheio de todas as tralhas possíveis, o cachecol do SCP sempre a postos, no banco de trás.
A verdade é que o meu Polo não me levou a lugares distantes e improváveis. Não, eu e o meu (meio) Polo não levantámos poeira em estradas de terra batida, percorrendo o mundo sem saber onde parar.
Tinha um sonho modesto. Queria encher o depósito e partir sem rumo, escolher ao acaso uma paragem no mapa, ou pura e simplesmente fazer pim-pam-pum nos cruzamentos e deixar-me levar. Mas ainda temos tempo Polinho...
E quando me perguntam pelo carro dos meus sonhos, falando de marcas de luxo, eu encolho os ombros. Não me preocupo muito com isso. O Polinho tem 4 rodas e leva-me a todo o lado. O Polinho não se queixa dos riscos nas portas, na traseira e na frente: de facto, ele está um bocado riscado, mas são como as rugas, sinais de experiência e vivência intensa. Mesmo quando, na auto-estrada, ele mostra o motor cansado e se arrasta nas subidas (em Monsanto subimos a 40 km/h), eu rio-me, na faixa da direita, com os velhinhos à minha frente a uns estonteantes 50km/h, até que consigamos atingir uma velocidade razoável (não há nada como uma bela descida).
Não me perguntem qual a marca do carro dos meus sonhos. Ou de que cor, a cilindrada, as polegadas das jantes. Olhem para o meu Polinho e lá está a resposta. :D
1 comment:
gostei de conhecer o teu carro no texto. bom paralelismo entre o Polo e o homem.
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